Há uns tempos, dei comigo a pensar…
coisa rara na minha pessoa que tende para a letargia e, consequentemente, para o pecado da preguiça
…que invejo…
novo pecado que já me está a levar a uma outra reflexão, completamente distinta da inicial que me leva a concluir que também sou um pecador
Bom, dizia que invejo aquelas pessoas que têm sempre algo a dizer a cerca de qualquer assunto, sem que fiquem remetidas a um qualquer silêncio constrangedor. Como aqueles que me acontecem de cada vez que me falam da Liga dos Campeões e me deixam a questionar que tipo de campeões usa ligas, em que modalidade? Ou que vão existir mais dois árbitros num campo de futebol, perfazendo um total de seis, e eu pensava que existia apenas um! Que há um modelo GT super Turbo de injecção electrónica que gasta não sei quantos litros aos 100, quando eu mal sei a matrícula do meu! Ou que há uma nova conjectura sócio-ecónomica na América do Sul que vai influenciar largamente as árvores petrificadas da Patagónia e que isso será muito mau para o Mundo. Ou que a Bébé faltou à vernissage do Martim de Vasconcellos, porque se zangou com a Pituxá e agora isso vai levar à queda da República.
Enfim, perder-me-ia aqui em exemplos da minha total e completa ignorância (também deve haver um pecado para isto, de certeza) que ficam sempre expressos no meu olhar esbugalhado de “burro a olhar para um palácio” ou em gaffes verbalizadas, quando lá arrisco um qualquer comentário. Geralmente quando o faço revela-se quase sempre desastroso e acompanhado por risos e uma palmadinha nas costas, cheia de compaixão: “- Tadinho!”
Ter sempre uma opinião formada e algo a comentar, nem que seja para dizer que nada se sabe, mas mantendo um ar de quem sabe e está informado de tudo, excepto daquele pormenor, é algo que exige mestria.
Decidi, assim, apostar na minha formação pessoal e apurar-me nessa mui nobre arte!
Pedi aos meus amigos que enviassem via mail novidades sócio-económico-culturais, actualizadas ao minuto.
Subscrevi diversas newsletters.
Tornei-me um encaminhante e reencaminhante informativo.
Espero que esta medida me catapulte para um lugar cimeiro no concurso de arremesso de parangonas e me destaque na rúbrica Actualidades.
Também vou passar a dizer sempre alguma coisa, nem que seja apenas para assinalar o facto de que “Eu estive aqui!”. Um pouco à semelhança das inscrições que certo tipo de pessoas deixa para trás, assinalando esse grande feito que foi: ter estado lá! No fundo, o nosso Padrão dos Descobrimentos Pessoal.
E já comecei a praticar!
No outro dia, ainda mal me tinham dito um nome de um livro -zás! - já eu estava a dizer: - Li! Muito bom! Faz-nos pensar. Marcou a minha vida. (não posso esquecer de ir comprá-lo!).
E num fôlego, acrescentei: Vai decorrer o Festival Anual de Arte Contemporânea Neo-Cubista com Ligeiros Laivos de Impressionismo. - Fiz um brilharete!
E desta vez fui eu a ser secundado pelo comentário súbito de alguém: Sim, Sim. Decorre todos os anos. (Esta até eu concluía!)
Depois arrisquei-me no campo tecnológico apresentando as vantagens de aderir à instalação de infra-vermelhos e antenas de captação via satélite que, num verdadeiro sistema wireless, pode ser ainda activado por voz ou outros sons que consigamos produzir com o corpo, bastando que associemos o som à função desejada, faz o interface entre o LCD (que funciona por touchscreen) e o router que por sua vez liga o portátil ao micro-ondas, à torradeira, alimenta o gato e activa o despertador, depois de ter enchido a banheira e acertado o relógio de pulso e carregado o telemóvel (e ficam a saber que está em desenvolvimento um dispositivo sub-cutâneo, para nunca o esqueçamos e que dispensa bateria, roubando impulsos electromagnéticos produzidos pelo cérebro, para que estejamos sempre contactáveis). Domótica, dirão. Muito mais além, meus caros, muito mais além!
Agora tenho andado a compor uma apresentação em diapositivos com fotos de quadros e esculturas. Só me falta ir à wikipédia tirar umas frases acerca dos estilos e uma ou outra com maior profundidade. Depois, vou enviá-la para todos os meus contactos, para que saibam que o seu amigo também é versado em artes.
No futuro, dedicar-me-ei a culinária e vinhos. E darei valentes puxões de orelhas a todos aqueles que se enganarem nas proporções necessárias à confecção de um soufflé e que não o saibam acompanhar com o respectivo vinho frutado com os taninos no sítio, que terá sempre de ser D.O.C. e I.P.R. de categoria V.Q.P.R.D. que me faz sempre lembrar S.P.Q.R., que também eram grandes apreciadores de vinho mas que, invariavelmente, o vomitavam, juntamente com a comida.
Por agora vou deleitar-me na degustação de um cocktail exótico, decorado com palhinha, sombrinha chinesa colorida, penacho de fitas brilhantes, rodelas de ananás, laranja e limão, uma miniatura do Cristo-Rei que segura uma azeitona numa mão e uma cereja na outra.
Enquanto aguardo que o sol de fim de tarde venha pousar sobre o mar (cheio de romantismo, como tem de ser), vou beberricando e escrevendo acerca desta experiência fantástica aconselhando vivamente à partilha da magnífica paisagem da Cova do Vapor.
lolololol
ResponderEliminarHumor cáustico???
Confesso... Não percebi patavina, mas como sou daquelas que digo sempre qualquer coisa... ihihihi
Recorro à frase: Isso acontece todos os anos! ;)
Peço desculpa... esqueci de colocar o título completo: A Mui Nobre Arte de Não Dizer Nada!
ResponderEliminarGostei... e percebi algumas partes... e tb sou daqueles que opina sempre sobre tudo... Sou o chamado TUDÓLOGO, eheheheh. Abraço
ResponderEliminarEu opino. Sobre quase tudo. Menos do que já opinei. Às vezes o silêncio, o meu silêncio, sabe-me bem. Deve ser da idade...
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